sábado, 8 de maio de 2010

Musicoterapia

Parte II


A musicoterapia como disciplina teve início no século 20 após a primeira e Segunda Guerra Mundial. Músicos amadores e profissionais passaram a tocar nos hospitais em vários paises da Europa e Estados Unidos para milhares de soldados veteranos. Logo os médicos e enfermeiros puderam notar melhoras no bem-estar dos pacientes.
De lá para cá, a música vem sendo cada vez mais incorporada às práticas alternativas e terapêuticas. Em 1972, foi criado o primeiro curso de graduação no Conservatório Brasileiro de Música, no Rio de Janeiro. Hoje, no mundo, existem mais de 127 cursos que vão da graduação ao doutorado.

Os musicoterapeutas acreditam que a técnica pode ajudar no equilíbrio e na saúde física, mental, emocional, energética e espiritual. E que os profissionais da área de saúde podem usar com sucesso a musicoterapia como uma ferramenta complementar de trabalho. Esse é, por exemplo, o caso do oncologista norte-americano Mitchell Gaynor que usa o "dahl tibetano", que ele chama de "tigela cantante" para tratar os pacientes com câncer.

"A música é uma linguagem específica, porém, universal, presente em todos os tempos. É uma forma genuína de expressão dos sentimentos e emoções e se traduz através dos mais diversas manifestações, evidenciando a essência do ser humano e de sua cultura. Atua nos conteúdos inconscientes, trazendo à tona memórias e experiências vivenciadas pelo indivíduo ou pelo coletivo, pois acessa áreas do psiquismo não autorizadas pelo consciente", atesta Marília Schembri, musicoterapeuta e eleita a primeira presidente da Associação de Musicoterapeutas do Estado de Minas Gerais.

Segundo Marília, cada ser humano é único e tem uma experiência física, emocional, mental e cognitiva próprias, individuais. A sua interação com o universo sonoro que o envolve, interna e externamente, amplia as possibilidades de se expressar, promovendo um estado de maior equilíbrio consigo mesmo e, conseqüentemente, com o outro. A música e seus elementos constitutivos são altamente expressivos e carregados de significados individuais e coletivos. Sendo inerente ao ser humano, a linguagem rítmico-sonoro-musical é capaz de estimular e despertar emoções, reações, sensações e sentimentos.
Um encontro com os sentimentos mais genuínos

"A musicoterapia atravessa espaços. Leva o paciente ao contato consigo mesmo e possibilita a expressão da emoção mais genuína. A medida em que se trabalha sonoramente com o indivíduo, ele expressa conteúdos internos, simbólicos e dificuldades. O seu potencial é aflorado e daí pode acontecer a cura. Isso porque um potencial reprimido, recalcado, pode gerar patologias", comenta a musicoterapeuta e pianista Sônia Carvalho.
O papel do musicoterapeuta é dar um caminho tranqüilo para que o paciente elabore suas limitações e descubra, dentro de si, o ser sensível e traumático. "A música possibilita encontros com memórias passadas, situações significativas vivenciadas e que, muitas vezes se encontram bloqueadas por experiências traumáticas ou inibidoras. Utilizada dentro de um contexto terapêutico, de forma consciente e apropriada, facilita a expressão dos conteúdos simbólicos individuais, promovendo o resgate genuíno do seu ser", ensina a pianista.
A música ajuda na expansão de percepções, proporcionando o contato com áreas do psiquismo praticamente esquecidas pela negação do si mesmo. Atua desbloqueando e facilitando a emersão de conteúdos psíquicos profundos, propiciando a expressão e a comunicação dos próprios desejos e necessidades", esclarece Sônia.

Fluxo vital

Terapeuticamente, a música faz com que o indivíduo expresse suas ansiedades, tensões, desejos, alegrias. Entra em contato direto com as emoções e sentimentos internalizados que, muitas vezes, estão bloqueados pela inibição, pelo estresse, pela falta de estímulo. A música, segundo Sônia, possibilita o despertar e o desenvolvimento do potencial criativo do indivíduo, impulsionando transformações que levam à modificação de padrões cristalizados, resgatando o fluxo vital e a saúde.
A utilização da música a partir de uma compreensão musicoterápica tem também um trabalho preventivo pois visa o "esvaziamento" e canalização das energias de tensão e ansiedade, impedindo que estas se acumulem e tenham como conseqüência, bloqueios psicossomáticos que geram o estresse e a depressão.

Técnica ajuda a equilibrar os ritmos interno e externo

Como atua o musicoterapeuta? Ele avalia o bem-estar emocional, a saúde física, o comportamento social, as habilidades comunicativas e funções cognitivas através de respostas musicais, planeja os atendimentos individuais ou em grupo, baseado nas necessidades do paciente e utiliza a improvisação, audição musical receptiva, composição de canções, análise lírica, música e imagens.
"A música trabalha os hemisférios cerebrais, promovendo o equilíbrio entre o pensar e o sentir, resgatando a "afinação" do indivíduo, de maneira coerente com seu diapasão interno. A melodia trabalha o emocional, a harmonia, o racional, a inteligência. A força organizadora do ritmo provoca respostas motoras, que, através da pulsação dá suporte para a improvisação de movimentos, para a expressão corporal. Tornamo-nos verdadeiros quando aprendemos a "escutar" a nossa música interna", explica Marília Schembri.
Para ela, o crescente número de patologias psicossomáticas é conseqüência da grande distância rítmica existente entre o tempo interno do ser humano, suas necessidades biológicas e psicológicas e sua relação com o tempo externo e a prontidão da tecnologia. " O homem acaba se perdendo ao se espelhar no ritmo desenfreado, modificando sua percepção temporo-espacial, comprometendo sua construção como indivíduo. A música, sendo uma linguagem articulada no tempo, facilita, então, a expressão temporal do ser, de suas buscas e anseios, assim como de seus desequilíbrios e frustrações" .

A musicoterapia é reconhecida pela Organização Mundial de Saúde e só pode ser exercida por profissionais graduados nos cursos superiores oferecidos em alguns Estados do Brasil. Marília Schembri explica que a técnica vem sendo usada na prevenção, no tratamento e reabilitação de indivíduos. "Ela tem excelentes resultados em deficiências físicas, paralisias, distrofia muscular progressiva, amputações, deficiências visual, auditiva, mentais, síndromes genéticas (Down, Turner, Rett), anóxia perinatal, lesões cerebrais, esquizofrenia, autismo infantil, depressões e distúrbio obsessivo compulsivo".